Quando criança, eu gostava de criar minha própria realidade a partir do universo de coisas disponíveis ao meu redor. Os brinquedos se tornavam o mundo inteiro e eu podia inventar o que quisesse. Sendo de uma família de quatorze irmãos, não faltavam personagens para entrar nas histórias que eu ia criando. Era uma forma sensível de olhar para cada objeto e transformá-los em ideias e sonhos. Até as brincadeiras eram feitas para agregar todas as crianças em um único propósito: ser feliz, leve e espontânea.
A minha memória latente me diz que era um lugar bom para estar; não tinha luxo, mas tinha terra, barro, mãos, risos, tombos, corridas, esconderijos, lugares secretos, manga no pé, chuva e goteiras, cantos e encantos, bolhas de sabão. Essa matéria da infância — simples, viva, cheia de imaginação — nunca me deixou. É dela que brota a essência do que crio hoje: uma arte feita com as mãos, com alma e com afeto, que mistura o rústico ao sagrado, o cotidiano ao simbólico.
Meu trabalho atravessa técnicas, lugares e tempos, mas o que sustenta tudo é esse mesmo olhar de menina: encantado com o que é pequeno, atento ao que é escondido, aberto ao que não se revela de imediato. A arte, pra mim, ainda é um jeito de inventar mundos.
Com carinho,
Anahata.


